na imensidão da dor, há um olhar rendido à saudade. as palavras, tranquilas, escondem o grito que um dia ecoou por todo o lado. na rua não reconhecemos. mas paramos e ouvimos agora, ali no ecrã, onde as fotografias se desenrolam sem pudor, numa ausência que já não sentem.
dizem que os filhos voltaram, estão ao seu lado. fingem não lembrar que um dia morreram. a atravessar a rua, num acidente de carro ou esquecidos num canto onde ninguém chegou a tempo. o tempo que agora atenua a dor, mas que quiseram saltar, como nos filmes em que se passam capítulos à frente. o tempo que os estrangulou e violentou e que agora emerge e cura um pouco todos os dias.
já não sonham. perderam a alegria. arrependem-se de tudo o que não fizeram juntos. arrependem-se sobretudo do que não valorizaram, de terem pensado que a eternidade estava ao alcance de uma vida.
dei comigo a ouvi-los e as lágrimas a cair. lágrimas de quem entende, mas não quer sentir nunca essa dor. lágrimas de quem se comove, de quem tem medo porque afinal não acontece só aos outros. lágrimas de quem já viu os outros que se afastam quando não suportam a nossa angústia. lágrimas de saudades de quem partiu. lágrimas de saudades do que ficou por viver.
perder um filho, assim começava a peça, é uma dor que não cabe em lado nenhum.